Diálogos indígenas sobre diversidade, ciência e sustentabilidade via podcasts
Data de execução do projeto: 5 de outubro de 2019 a 5 de abril de 2020
Semana Nacional de Ciência e Tecnologia: de 21-27 de outubro de 2019
Tema: “Bioeconomia: Diversidade e Riqueza para Desenvolvimento Sustentável”.
Resumo
Esta proposta consiste em empoderar estudantes indígenas da Unicamp, que inaugurou seu Vestibular Indígena em 2019. O objetivo é, através de podcasts, capacitar os estudantes indígenas como mediadores do diálogo entre a Unicamp – Universidade com uma das maiores produções científicas do País – e a população de São Gabriel da Cachoeira (AM), município com a maior população indígena no país, região de origem dos estudantes. O diálogo tão necessário para derrubar preconceitos e fortalecer a diversidade de conhecimentos é chave para o desenvolvimento sustentável e a melhor interação entre ciência e sociedade. Foram produzidos cinco programas de podcast sobre o tema guarda-chuva “Bioeconomia: diversidade e riqueza para o desenvolvimento sustentável”. Cada episódio coloca em debate os desafios, as práticas sociais e de pesquisa, a cultura indígena e científica, a diversidade de culturas e de visões necessárias para o desenvolvimento sustentável tendo a Amazônia como pano de fundo. Ao trazer estudantes indígenas para a comunidade acadêmica, a Unicamp tem a oportunidade de trocar conhecimentos científicos, quebrar preconceitos e construir canais de diálogo sobre questões fundamentais para as populações indígenas, a pesquisa e a sociedade tendo os estudantes como moderados e protagonistas deste processo.
Palavras-chave: Desenvolvimento sustentável; Divulgação científica; Indígenas; Podcast; Rádio
Abstract
This project consists in empowering indigenous students from Unicamp, where a pioneer program to include Indigenous students has began in 2019. The objective is, through science communication, more specific through podcast, to empower indigenous students as mediators of dialogue between Unicamp – University with one of the largest scientific output in the country – and the population of São Gabriel da Cachoeira (AM), a city with the largest indigenous population in Brazil and where the majority of students come from. Five podcasts were produced on the topic “Bioeconomics: Diversity and Wealth for Sustainable Development”. Each episode addresses aspects that bring to debate the challenges, social and research practices, indigenous and scientific culture, the diversity of cultures, and visions necessary for sustainable development focusing on the Amazon background. By bringing indigenous students at university, Unicamp has the opportunity to exchange scientific knowledge, destroy bias, and strengthen its investigations and relationship with indigenous communities and population in general through indigenous students as moderators.
Key-words: Sustainable development; Science communication, podcast, social media, indigenous populations, radio
Objetivo geral
Este projeto pretende estabelecer canais de diálogo entre estudantes indígenas e a comunidade universitária, bem como entre a população de São Gabriel da Cachoeira (AM) e a universidade. O rádio e o Whatsapp são meios de comunicação de grande relevância para as populações mais jovens em São Gabriel da Cachoeira (AM) e no Brasil, soma-se o uso das redes sociais, com enfoque no Facebook. Programas de divulgação científica em formato de áudio (podcasts), a ser disseminado via redes sociais, rádio e Whatsapp (por meio de smartphones) é o objetivo deste projeto.
Objetivos específicos
a) Empoderar os estudantes indígenas da Unicamp através de seu protagonismo em programas de áudio. Capacitar os estudantes para desenvolver pautas, produzir programas de podcast lhes dará autonomia para investir em novos formatos e mídias. Sua interlocução com acadêmicos (especialistas, estudantes, por exemplo) e com membros da comunidade indígena lhes trará mais familiaridade com questionamentos e desafios de ambos os grupos facilitando sua busca por respostas individuais e melhorando a interação com acadêmicos da universidade em que atuam, contribuindo para políticas de inclusão e empoderamento de populações indígenas.
b) Desconstruir estigmas e preconceitos da comunidade acadêmica sobre as populações indígenas e destas com aquela, potencializando as relações com os estudantes indígenas da Unicamp. Provocar o debate sobre os desafios do desenvolvimento sustentável, relevante para mudar a percepção de e sobre acadêmicos e indígenas. As pautas dos programas serão desenvolvidas a partir de demandas das comunidades indígenas que poderão ser consultadas por meio do próprio podcast ou acompanhamento de canais de rádio de comunicação de São Gabriel da Cachoeira, além de consulta à comunidade acadêmica e estudantes indígenas da Unicamp. O engajamento dos ouvintes do programa de podcast nas redes sociais e rádio comunitária também servirá para pautar temas e questões a serem desconstruídas ou reconstruídas pelos estudantes indígenas da Unicamp.
c) Divulgar ações e pesquisa da universidade sobre “bioeconomia: diversidade e riqueza para o desenvolvimento sustentável” para comunidades indígenas, bem como trazer demandas das comunidades indígenas que poderão incentivar pesquisas e ações da Unicamp neste tema. Ampliar o diálogo e colaborações entre Unicamp e comunidade indígena. Mapear pesquisas que estão em desenvolvimento na Unicamp sobre a temática da Semana Nacional de C&T e divulgar para as comunidades indígenas, por meio dos podcast, os resultados, desafios e demandas de pesquisadores com as comunidades indígenas. Da mesma forma, mapear com uso da mídia (rádio e redes sociais) quais são as principais demandas e desafios das comunidades indígenas e estabelecer canais de diálogos entre um e outro.
d) Desenvolver estratégias de comunicação para engajar audiências em diferentes canais (podcast/rádios comunitárias). Estabelecer diálogos e colaborações entre rádios comunitárias em São Gabriel da Cachoeira onde possamos estabelecer colaborações para divulgar nosso podcast em canais que já tenham públicos cativos; experimentar e avaliar disseminação do mesmo programa nas diferentes plataformas: Spotify, redes sociais (Facebook e WhatsApp) e rádio comunitária. A experimentação de distintas práticas de comunicação nos dará elementos para estabelecer melhores estratégias de disseminação de informação e diálogo com ouvintes.
e) Estabelecer parcerias com universidades que possuam programas de divulgação científica e que tenham estudantes indígenas que possam fortalecer os podcasts, sejam com participações nos podcasts, seja com outras iniciativas de divulgação científica que melhorem o diálogo entre academia e populações indígenas.
Justificativa
Entre as universidades paulistas, a Unicamp foi a primeira a levar a aplicação da prova do Vestibular Indígena para a cidade de São Gabriel da Cachoeira (AM), município mais indígena do Brasil. A partir do contato com a região, da experiência em relação à prova e à realidade local, ficou evidente o potencial de uma atividade voltada para os jovens que moram nas comunidades espalhadas pelo enorme território, cujas fronteiras chegam à Colômbia e à Venezuela. As áreas do conhecimento buscadas pelos estudantes indígenas evidenciaram a demanda desse público pelo ensino e pesquisa em cursos de Ciências Naturais e Ciências Exatas – justamente aqueles que estarão envolvidos neste projeto. Em sua primeira edição, as dez carreiras mais procuradas do Vestibular Indígena foram: Enfermagem; Administração; Farmácia; Administração Pública; Engenharia Elétrica; Pedagogia; Engenharia de Produção; Arquitetura e Urbanismo; Engenharia Agrícola e Engenharia Elétrica.
Já na Unicamp, passados alguns meses da chegada dos estudantes, percebeu-se o envolvimento intenso do grupo com atividades acadêmicas e de pesquisa e a disposição em divulgar essas ações a outros estudantes. Por outro lado, também nota-se o risco de um índice alto de evasão e fracasso escolar entre estes estudantes, chegando a superar 60% (LOPES, 2017; CORDEIRO & ZARPELON, 2004) comparados aos 30%. Nesse aspecto, uma ação que vise reduzir as barreiras em relação à visão da comunidade sobre eles se torna fundamental. Assim, a primeira turma de estudantes indígenas da Unicamp participará da iniciativa, atuando como multiplicadores da ciência. Abordarão os projetos em que estão envolvidos no ambiente acadêmico-científico nas diferentes áreas do conhecimento, especificamente aquelas citadas acima.
O rádio ainda é um dos meios de comunicação mais populares no Brasil atingindo 86% da população (IBOPE, 2018). No entanto, quando se trata de informação de ciência e tecnologia, a internet ainda é o principal canal para obter informações, como mostrou a última pesquisa de Percepção Pública da C&T no Brasil com 39%, perdendo apenas para a TV com 48% (CGEE, 2019).
Neste cenário, os podcasts despontam como veículo de comunicação em crescimento e com grande potencial de divulgação científica. No Brasil, o número de podcasts sobre ciência e tecnologia ainda são restritos apesar do público crescente (DANTAS-QUEIROZ, WENTZEL e QUEIROZ, 2018). No entanto, Takata (2019) verificou que desde 2014 é possível observar um crescimento no número de podcasts que cobrem ciência e tecnologia no Brasil, o que é razão de otimismo para investirmos nesta mídia e na expansão de públicos para a divulgação científica. O formato em áudio, descontraído e que permite ao ouvinte realizar multitarefas (HU, 2016; LÚCIO, 2014) (por exemplo ouvir enquanto está em trânsito, fazendo atividade física ou mesmo fazendo trabalhos domésticos) faz do podcast um veículo de comunicação acessível para diferentes públicos. Marques (2018) reforça que os podcasts permitem criar conteúdos de divulgação científica com qualidade a partir de poucos equipamentos como um computador conectado a um microfone apropriado e fazendo uso de software de edição de áudio. Outra característica relevante para a aposta da divulgação científica por meio de podcasts é sua capacidade de tratar dos temas com profundidade, já que se trata de áudio que não compete com outras atividades (o vídeo, por exemplo, exige que o público esteja ouvindo e vendo, sem poder se distrair). Dado que vivemos em uma época em que o público lê cada vez menos e que as informações são consumidas de forma cada vez mais superficiais e rápidas, fruto do comportamento de uso das redes sociais, o podcast traz ainda outra vantagem em seu formato.
No caso de populações indígenas, acreditamos que o podcast tem ainda uma versatilidade porque pode ser compartilhado via Whatsapp, redes sociais, bem como por meio de canais de rádio e atingir, portanto, um público amplo.
Metodologia de implantação
A população indígena brasileira chegou a 818 mil em 2010, dos quais 315 mil estão em áreas rurais (Censo 2010). Segundo o Censo da Educação Superior (MEC, 2016), o número de estudantes indígenas nas universidades chegou a pouco mais de 49 mil em 2016. A Universidade do estado do Paraná (Unespar) foi pioneira, em 2002, ao reservar três vagas para estudantes indígenas, selecionados por meio de vestibular específico. Parte das leis que garantiram mudanças nas políticas públicas para maior inserção dos povos indígenas no ensino superior está relacionada a demandas dos povos indígenas, mas com pouca participação de especialistas indígenas (BERGAMASCHI, DOEBBER & BRITO, 2018). Com mais estudantes indígenas nas universidades, mais elaboradas poderão ser as políticas públicas a eles destinadas.
A divulgação científica pode ser uma aliada no incentivo aos jovens para a carreira científica. Um dos desafios que se coloca no cenário de algumas universidades públicas paulistas em relação aos jovens indígenas é também em relação à permanência. Com a chegada da primeira turma de aprovados em fevereiro de 2019, há a oportunidade de trabalhar com esses ingressantes para, por meio da divulgação de ciência, atrair novos alunos indígenas para o ambiente acadêmico-científico, melhorar seu acolhimento e interações na universidade, desconstruir preconceitos em ambos os lados, estimular a diversidade etnocultural e a defesa do acesso à educação e ciência. O fortalecimento dos vínculos desses alunos com a Universidade reforça seu protagonismo e, consequentemente, contribuir para a redução dos índices de evasão (alta nesse grupo). A população de São Gabriel da Cachoeira (AM) e a comunidade acadêmica da Unicamp (em torno de 40 mil estudantes, 8 mil funcionários e 2 mil docentes e pesquisadores) são os nossos públicos-alvo.
Um programa de divulgação científica em formato de áudio – a ser disseminado via podcast (internet), rádio e redes sociais (enfoque no Whatsapp, por meio de smartphones). Para tanto, o grupo formado por divulgadores científicos e comunicadores orientará o trabalho com um grupo fixo de três estudantes indígenas e com outros estudantes colaboradores, conforme a disponibilidade e interesse.
Os podcasts foram desenvolvidos dentro da temática da Semana, “Bioeconomia: Diversidade e Riqueza para Desenvolvimento Sustentável”, relacionando pesquisas desenvolvidas na Unicamp e os estudantes indígenas, na produção de cinco episódios a serem veiculados durante a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia.
Público-alvo prioritário
O projeto envolve estudantes indígenas da Unicamp que terão papel protagonista para mediar o diálogo com a comunidade acadêmica da Unicamp e a comunidade indígena de São Gabriel da Cachoeira (AM). Atualmente são cerca de 150 estudantes indígenas na Unicamp.
Instituição de execução do projeto: Laboratório de estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) do Núcleo de Desenvolvimento da Criatividade (Nudecri), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) http://www.labjor.unicamp.br/
Referências
BERGAMASCHI, M.A.; DOEBBER, M.B. & BRITO, P.O. Estudantes indígenas em universidades brasileiras: um estudo das políticas de acesso e permanência. Rev. bras. Estud. pedagog., Brasília, v. 99, n. 251, p.37-53, jan./abr. 2018.
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo 2010. Censo 2010: população indígena é de 896,9 mil, tem 305 etnias e fala 274 idiomas. Disponível em: https://censo2010.ibge.gov.br/noticias-censo?busca=1&id=3&idnoticia=2194&t=censo-2010-poblacao-indigena-896-9-mil-tem-305-etnias-fala-274&view=noticia (acessado em 18/08/2019)
CGEE – Centro de Gestão e Estudos Estratégicos. Percepção Pública da C&T no Brasil – 2019. Brasília, 2019. Disponível em: https://www.cgee.org.br/documents/10195/734063/CGEE_resumoexecutivo_Percepcao_pub_CT.pdf (acesso em 22/08/2019)
CORDEIRO, M.J.J.A. & Zarpelon, S.F. Indígenas cotistas da UEMS: acesso, permanência e evasão dos primeiros ingressantes em 2004. Educação e Fronteiras On-Line, Dourados/MS, v.1, n.1, p.65-79, jan/abr. 2011.
DANTAS-QUEIROZ, M.V.; WENTZEL, L.C.P. e QUEIROZ, L.L. Science communication podcasting in Brazil: the potential and challenges depicted by two podcasts. Anais Acad. Bras. Ciênc, vol.90 n2. Rio de Janeiro. Apr./June 2018. Consultado em agosto/2019. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0001-37652018000401891
HU, J. C. 2016. Scientists ride the podcasting wave. Science, p. 1-5. Disponível em: http://www.sciencemag.org/careers/2016/11/scientists-ride-podcasting-wave (acessado em 19/08/ 2019).
IBOPE Media – Kantar IBOPE Media. 5ª edição do estudo anual da Kantar IBOPE Media. 2018.
LOPES, M.S. Evasão e fracasso escolar de alunos de comunidades indígenas do Instituto Federal de Roraima/ Campus Amajari: um estudo de caso. Dissertação de mestrado defendida no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora. 2017.
LUCIO, Luiz (org). Reflexões sobre o Podcast. Rio de Janeiro: Editora Marsupial, 2014.
MARQUES, F. Microfones abertos para a ciência. Revista Pesquisa Fapesp, 14/03/2019. Disponível em: http://revistapesquisa.fapesp.br/2019/03/14/microfones-abertos-para-a-ciencia/ (acesso em 22/08/2019)
MEC – Ministério de Educação do Governo Federal. Notas estatísticas: Censo da Educação Superior. 2016. Disponível em: http://download.inep.gov.br/educacao_superior/censo_superior/documentos/2016/notas_sobre_o_censo_da_educacao_superior_2016.pdf (acesso em 22/08/2019)
TAKATA, R. Evolução dos podcasts de ciência no Brasil. Blog Gene Repórter. Mar 26th 2019. Disponível em: http://genereporter.blogspot.com/2019/03/evolucao-dos-podcasts-de-ciencia-no.html (acesso em 22/08/2019)